O bebum e o capeta


 
Em toda a cidade pequena existe um bebum e em Santaluz, no interior da Bahia, não era diferente. Ele tornou-se atração da cidade de tanto aprontar durante suas bebedeiras, assanhava as carolas que iam todos os dias à missa pela manhã, mostrava as partes em praça publica, arrumava briga nos botecos e todos os dias pela manhã, alguma alma caridosa arrastava o bebum dos bancos da praça e sarjetas para casa aos cuidados de sua esposa. Ela, já cansada de tanta humilhação que passava por conta das bebedeiras do marido, resolve então pedir ajuda ao padre para tentar salvar a alma do bebum que, pelo andar da carruagem, estava fadado ao inferno. O padre aconselha a, antes de qualquer coisa, pedir aos comerciantes e botecos da cidade que não fosse mais vendida cachaça à ele, assim, sóbrio, seria possível lhe pregar a palavra de Jesus Cristo e salvar sua alma condenada.

E ela assim fez, conversou com todos os donos de bares, botecos e mercados de Santaluz e pediu, encarecidamente, que não fosse mais vendida bebida ao seu marido, mesmo que este implorasse e esbravejasse, afinal, era para o seu próprio bem. E todos concordaram. Depois de acordar, lavar o rosto e se aprontar para o trabalho como ajudante de pedreiro, o bebum saiu da casa e, como de costume, antes de chegar ao trabalho, passou no boteco para pedir uma cachaça para firmar a mão – Não vou lhe vender nada hoje. Passou em outros bares e botecos da cidade, e teve a mesma resposta. Intrigado e sem saber o motivo de tal conspiração, perguntou a todos o que sucedia e então foi que ficou sabendo, estavam proibidos de lhe vender bebida, ordens sua mulher. Ele enfurecido, voltou pra casa para tirar satisfações com ela que deu de ombros e falou – é pro seu próprio bem.

Passados alguns dias, o bebum já não se aguentava mais, tinha tremedeiras, insônia, ataques de fúria seguidos de crises de choro e xingamentos. Tentou novamente pedir ao dono do bar que lhe vendesse uma dose, tinha dinheiro poderia pagar o quanto quisesse e mesmo assim de nada adiantou, todos estavam irredutíveis na proibição acordada. Foi então que o bebum, indignado com aquela situação falou, alto pra quem quisesse ouvir, que faria qualquer coisa por uma dose de cachaça, nem que para isso tivesse que vender a alma ao capeta.

Surge então um homem montado em um cavalo negro e imponente, muito bem afeiçoado, barba bem feita, cabelos longos e brilhantes, vestindo uma roupa preta e chapéu com abas largas que lhe cobria todo o rosto. Aproxima-se do bebum e, tirando uma garrafa de cachaça de uma bolsa de couro que carregava a tiracolo, oferece um trago ao bebum. Sapecou uma, duas, três, quatro doses, e o bebum feliz da vida era só elogios ao nobre desconhecido, grande amigo, homem de bom coração.

Depois de entornar quase uma garrafa inteiro, o bebum pergunta ao homem de negro – Como se chama...ic!...homem de tão bom...ic!...coração?. O misterioso homem tira então o chapéu, mostrando dois chifres, e com os olhos cor de fogo revela – Sou Lúcifer! O senhor das trevas!. O bebum, cambaleante e totalmente embriagado, aproxima-se do capeta e mirando seu par de chifres, fala – Pois com esses chifres aí...ic!...eu tô achando que tu é...ic! um grande corno!

Adaptado da história contada por Zé de Souza, contador de “causos” e conhecido como o maior mentiroso do mundo. Comunidade Lagoa dos Bois, Santaluz/BA.

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